A criação de uma Lei Estadual para promover ações em prol de crianças e adolescentes com altas habilidades ou superdotação no Paraná pode transformar o estado em referência para o país. Essa é a visão manifestada por especialistas e pais durante uma audiência pública para tratar sobre o tema, realizada nesta terça-feira (21), na Assembleia Legislativa do Paraná.
A audiência foi proposta pelo deputado estadual Evandro Araújo (PSD), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente e da Pessoa com Deficiência (CRIA), que também é autor do Projeto de Lei 564/2021, que cria diretrizes para a implantação de políticas públicas estaduais na rede pública de ensino.
“Hoje, um estudante com essas capacidades, em geral, não encontra um ambiente adequado na escola para desenvolver suas habilidades. Muitas vezes, por não ser compreendido, não é aceito, sofre bullying, se isola. Isso é uma grande dor para suas famílias, que sofrem junto, com crianças que ficam depressivas e ansiosas”, explicou o deputado.
“Ouvimos as famílias, os especialistas e os educadores que também têm dificuldades para adotar medidas adequadas nas salas de aula. Precisamos enfrentar essa discussão e essa audiência pública é o ponto de partida para concretizar essa política ao nível de estado. Iremos sistematizar todas as contribuições e fazer os ajustes necessários para melhorar o projeto”, completou Araújo.
Os debates foram regados com muita emoção, sobretudo, com o relato das dificuldades enfrentadas pelas mães de crianças identificadas com altas habilidades ou superdotação (AH/SD). Já os especialistas da área médica, jurídica e governamental falaram sobre os desafios e perspectivas de cada área sobre o tema.
Foi consenso entre os participantes da audiência a necessidade de aprovação do PL 564/2021 como marco legal para implantar ações concretas para os educandos com AH/SD.
“O Paraná vem desenvolvendo um trabalho bom, mas é claro que há muito o que se fazer. Criar uma Lei é extremamente importante, pois uma vez aprovada ela subsidiará todas as ações em curso e também novas ações da própria Secretaria de Educação”, destacou Denise Maria de Matos, do Departamento de Educação Especial da Secretaria de Estado da Educação (SEED).
Segundo dados da SEED, hoje no Paraná são 5.630 estudantes paranaenses identificados com alta habilidades ou superdotação na rede pública de ensino estadual. Destes, 2.854 participam do Atendimento Educacional Especializado (AEE), que oferece atividades complementares para potencializar a capacidade dos estudantes.
“A gente estima que até 3% dos estudantes regularmente matriculados possam ter essa capacidade. Temos cerca de 1,1 milhão de estudantes na rede estadual. Portanto, podemos ter cerca de 35 mil estudantes para serem identificados no Paraná. E a Lei, certamente, nos ajudará neste objetivo”, completou Denise.
DIFICULDADES — Com muitas mães e familiares de crianças com AH/SD presentes na audiência, as dificuldades das famílias também foram amplamente debatidas. Caroline Volpato, mãe de uma criança identificada aos 4 anos, disse que os pais geralmente são mal interpretados pela sociedade em suas demandas. “Muitos pais se calam, por sermos mal interpretados, por nos acharem prepotentes, por dizerem que nosso filho é melhor que outro, o que não é verdade. Falta conhecimento técnico nas escolas, sem isso não dá para identificar”.
Paula Sakaguti, professora e mãe de criança com AH/SD, comentou sobre a sorte de ter encontrado alguma adaptação para o seu filho na educação infantil. No entanto, ela destacou que isso não acontece geralmente e seu filho também encontrou muita dificuldade na faculdade. “Os talentos só não se perdem graças ao apoio das famílias”.
Já a psicóloga Cristina Maria Carvalho Delou, doutora em Educação e especialista em superdotação, defendeu a aceleração de nível escolar para crianças e adolescentes, nesta condição, como forma de adequação ao seu nível de conhecimento. “Estamos gastando dinheiro público para alfabetizar crianças que já são alfabetizadas, que falam línguas sem nunca terem um professor. A falta de aceleração de nível escolar é algo que precisa ser superado”, defendeu.
O médico psiquiatra e doutor em Saúde Mental, Felipe Pinheiro de Figueiredo, falou sobre a dupla excepcionalidade e riscos da inadequação escolar. “É mais regra que exceção. É uma condição unindo altas habilidades em conjunto com um transtorno mental. Às vezes a criança fica tão ansiosa por desempenho que vai mal numa prova. O que era alta habilidade e ansiedade leve, se agrava, podendo levar a depressão e suicídio”, alertou.
A pedagoga especialista em AH/SD, Greice Cristiane dos Santos Carraro; a psicóloga, Silvia Altoé, mestre em Identificação e Avaliação da AH/SD e a advogada Fabrizia Angelica Bonatto Lonchiati também participaram e contribuíram para a audiência pública.